Pesquisas e estudos enumeram diversos motivos que podem levar uma pessoa ao hábito de fumar. Entretanto, a mais importante discussão é sobre o efeito que a fumaça do cigarro e seus componentes – são mais de 4 mil substâncias nocivas – provocam não só na cavidade oral, mas em todo o organismo humano.
Confira a seguir trechos da entrevista do Dr. Orlando Parise Júnior, médico e cirurgião especialista em cabeça e pescoço e funcionário no Hospital Sírio-Libanês de São Paulo, para o Dr. Drauzio Varella.
AGRESSIVIDADE DA FUMAÇA DO CIGARRO
Drauzio – Quais os danos causados pela fumaça carregada de agentes químicos que o fumante joga na boca dezenas ou mesmo centenas de vezes ao dia?
Orlando Parisi – A primeira coisa a considerar é que na fumaça do cigarro não há apenas nicotina e alcatrão. Testes laboratoriais demonstram nela existirem centenas de compostos comprovadamente cancerígenos que agridem a mucosa da boca. Além disso, ela sai do cigarro muito quente. Portanto, os danos à mucosa não advêm apenas dos agentes químicos, mas também da agressão térmica resultante da alta temperatura em que a fumaça é absorvida. Há, ainda, outra agravante. Associar tabaco a bebidas alcoólicas implica consequências dramáticas, porque o álcool ajuda a dissolver tanto a nicotina quanto as demais substâncias nocivas presentes no cigarro, aumentando sua concentração.
Drauzio — O cigarro é uma droga compulsiva, que provoca repetidas, intensas e desagradáveis crises de abstinência. Como orientar as pessoas que desejam abandonar de vez o cigarro?
Orlando Parisi — De fato, deixar de fumar não é fácil. Já assisti a todos os tipos de tentativas e de fracassos. Por isso, encaminhamos essas pessoas para grupos de apoio nos quais encontrarão profissionais especializados para ajudá-las.
LESÕES PREDISPONENTES PARA O CÂNCER DE BOCA
Drauzio – Você poderia falar das lesões pré-malignas que aparecem na boca?
Orlando Parisi – O câncer da boca basicamente incide sobre a população masculina, na proporção de três homens para cada mulher. Por isso, o cuidado maior deve recair sobre os homens na quarta década de vida e tabagistas. Neles, toda a lesão branca ou vermelha que surgir na boca precisa ser vista e acompanhada por um médico. O termo científico para tais lesões é leucoplasias com eritoplasias. São placas brancas, bem delimitadas, com aspecto mais ou menos característico, que aparecem na mucosa da bochecha, na língua ou no assoalho da boca.
Drauzio — Essas lesões sangram?
Orlando Parisi — Elas não sangram necessariamente. Na verdade, são muito heterogêneas na apresentação. Algumas formam um tumor na boca; outras, uma ferida ulcerada ou uma placa completamente assintomática. O aspecto é bastante variável. Por isso, qualquer coisa anormal que se note na boca, em especial na borda da língua, é motivo de preocupação e um médico deve avaliar o problema.
Drauzio — Os tumores de boca começam sempre por essas lesões ou eles podem instalar-se sem que elas surjam antes?
Orlando Parisi — Às vezes, eles se instalam diretamente sem que o doente perceba a presença de uma lesão pré-existente. De modo geral, estima-se que aproximadamente 90% dos portadores de tumores malignos de cabeça e pescoço ligados ao consumo de tabaco e álcool sejam tabagistas e 70% ingiram álcool com frequência.
EXAMES PERIÓDICOS COM ESPECIALISTAS
Drauzio — O fumante, mesmo que não tenha nada, de quanto em quanto tempo precisa ir a um especialista para examinar a boca?
Orlando Parisi — No mínimo, uma vez por ano, de preferência a cada seis meses, o fumante deve submeter-se a exame rigoroso da cavidade oral.
AUTOEXAME
Drauzio – Você acha que o autoexame, isto é, a pessoa examinar a própria boca diante do espelho, abaixando a língua com uma colher e erguendo-a em seguida, ajudaria na prevenção da doença?
Orlando Parisi – Acho útil, mas é pouco provável que o autoexame ajude a pessoa a diferenciar as lesões benignas das malignas por causa da heterogeneidade de aspecto dessas lesões. Em relação ao câncer de mama, por exemplo, é fácil explicar à mulher a importância de apalpar o próprio seio e, notando algum caroço, procurar imediatamente o médico. Na boca, entretanto, não existe um único sinal característico de lesão maligna. Por isso, insisto: percebendo alguma coisa anormal na boca, a pessoa deve procurar um médico.
Fonte:
Dr. Drauzio Varella em entrevista com o Dr. Orlando Parise Júnior, médico e cirurgião, especialista em cabeça e pescoço e funcionário no Hospital Sírio-Libanês de São Paulo.
https://drauziovarella.uol.com.br/entrevistas-2/o-cigarro-e-a-boca/